«O presidente (Bolsonaro) não me quer no cargo e eu sempre quis manter meu compromisso de respeitar o estado de direito», disse Moro em uma intervenção de cerca de 40 minutos para corroborar sua saída do cargo.
Ele esclareceu que sua única condição ao assumir a liderança da Justiça era que «se algo acontecesse comigo, minha família não seria abandonada».
Ele reiterou que lhe foi prometida carta branca para trabalhar e que lamentou que sua demissão ocorra em meio a uma crise de saúde e à luta contra a pandemia de Covid-19.
Segundo Moro, ele sempre comunicava ao chefe de estado que precisava de uma causa para aprovar a mudança na direção-geral da Polícia Federal (PF), pois o trabalho nesse comando estava sendo positivo.
Bolsonaro demitiu o chefe da PF, Maurício Leite Valeixo, o braço direito de Moro. O decreto da referida separação foi publicado nesta sexta-feira no Jornal Oficial da União.
A demissão aumentou a tensão entre Bolsonaro e Moro, que ameaçavam entregar o emprego se o capanga fosse demitido, como era o caso.
Valeixo e Moro trabalharam juntos na operação anticorrupção Lava Jato, o que lhes permitiu alcançar os cargos que ocupavam.
O ex-magistrado insistiu que há uma interferência clara e política na PF e Bolsonaro quer que alguém em quem confie nessa direção, tenha contato pessoal e esteja ciente das investigações, um pedido inadmissível, segundo o ministro.
«Tive outras divergências e muitas convergências com o presidente, que não me quer no cargo», disse Moro, que defendeu seu compromisso de respeitar o Estado de Direito.
O ex-juiz seria o segundo detentor de uma carteira importante, que deixou o executivo nas últimas semanas.
Bolsonaro depôs o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, após desentendimentos entre os dois sobre isolamento social, a principal medida para enfrentar a pandemia de Covid-19, mas que o governante não compartilha.
Fontes jornalísticas garantiram que mesmo os ministros da ala militar, como os generais Walter Souza Braga Netto, chefe da Casa Civil, e Luiz Eduardo Ramos, chefe do portfólio do governo, tentaram convencer o ex-magistrado a permanecer no cargo.
Moro ganhou notoriedade nacional e internacional ao comandar, entre março de 2014 e novembro de 2018, o julgamento na primeira instância dos crimes identificados no caso Lava Jato.
Sem provas, Moro puniu o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 12 de julho de 2017, por nove anos e seis meses de prisão por supostos atos de corrupção, sendo esta a primeira vez na história brasileira que um ex-chefe de Estado foi condenado criminalmente, decisão confirmada em segunda instância.
Com suas manobras e a colaboração de generais e juízes, ele também impediu a candidatura de Lula em 2018, quando era o favorito a prevalecer nas eleições presidenciais que Bolsonaro ganhou.
Em novembro de 2018, Moro concordou em ser ministro do governo Bolsonaro, que comentou que teria «carta branca» para designar e executar ações na luta contra o crime organizado e a corrupção.
E, nesse cenário, ele deixou o cargo de juiz federal, ao aceitar o convite do presidente, com a promessa de ter total autonomia.
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